O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa, apartidária e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação para zelar pela integridade da informação que molda o debate público. O objetivo é oferecer à audiência uma compreensão clara e confiável dos acontecimentos e contribuir para uma sociedade mais bem informada e resiliente à desinformação.
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Política

Investigado por: 08/09/2025

Perfis no TikTok usam IA para disseminar desinformação sobre política

Política
Conteúdos exploram temas em alta e usam linguagem alarmista para viralizar, misturando informações verdadeiras com alegações falsas.

Se você navega pelo TikTok, provavelmente já se deparou com algum vídeo de política criado por inteligência artificial. Tantos conteúdos proliferando na rede social têm chamado a atenção dos leitores do Comprova, que enviam alguns deles para o nosso WhatsApp perguntando se se trata de desinformação ou não. A resposta é: muitos desses perfis desinformam, sim.

Eles têm alguns pontos em comum, como o viés de direita e a escolha das pessoas retratadas nos vídeos. É comum que estes perfis publiquem vídeos sobre pessoas como o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, do Brasil, Lula, da China, Xi Jinping, o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Alexandre de Moraes.

Ao se fazer uma busca no TikTok pelo nome de Moraes, por exemplo, os primeiros perfis exibidos são de dois veículos de imprensa, UOL e Metrópoles, mas a terceira sugestão do resultado leva para um vídeo sobre a possibilidade de Trump mandar invadir o Brasil para prender Moraes, conteúdo já desmentido pelo Comprova.

Ao clicar no perfil, o Comprova logo concluiu que se trata de uma página que desinforma. Dos cinco vídeos mais recentes publicados pela página até 1º de setembro, quatro continham desinformação. Exceto o primeiro post, sobre exibição do caso de Hytalo Santos no Profissão Repórter, os quatro seguintes misturavam informações verdadeiras a mentiras. É o caso de uma gravação que cita o atracamento de navios norte-americanos na costa da Venezuela e supostos “planos de evacuação da fronteira” do Brasil com o país vizinho, sobre os quais não há evidências. Outro post diz que os Brics apresentaram sua nova moeda, o que não é verdade, como mostrou o Estadão Verifica.

A tática de adicionar afirmações falsas a fatos recém-ocorridos é comum no mundo da desinformação. Como o assunto está “quente”, a chance do post aparecer como sugestão em buscas e, assim, obter curtidas e compartilhamentos, é grande.

Inteligência artificial

É possível perceber que se trata de IA ao fazer uma análise dos vídeos. Normalmente, eles mostram fotos — verdadeiras ou criadas pela tecnologia — ou mesmo intercalam os dois tipos. Preste atenção se há imagens hiper-realistas ou trechos de vídeos em que a pessoa aparece, mesmo que rapidamente, com alguma distorção nas mãos ou em outros locais do corpo. É provável que tenha sido criada por IA.

Você também pode recorrer a ferramentas de reconhecimento da tecnologia. O Comprova pediu que o Hive Moderation analisasse um vídeo publicado por um dos perfis verificados e a resposta foi que o conteúdo tem 99,9% de chance de ter sido gerado por IA. Vale lembrar que essas ferramentas podem falhar na detecção de conteúdos, por isso devem ser usadas como apoio à análise humana.

I Legenda: Análise feita pelo Hive Moderation mostra uso de IA.

Combinados às imagens, os posts costumam trazer uma narração, muitas vezes com voz robótica. Com o avanço das tecnologias, em alguns posts é mais difícil de detectar o uso de IA na voz, mas a combinação de um narrador que diz supostas notícias bombásticas, sem citação de fontes, com imagens intercaladas das pessoas mencionadas pode indicar que se trata de desinformação.

Outro ponto em comum desses conteúdos de desinformação, que pode ajudar os usuários da rede a detectar se é desinformação ou não – ou desconfiar, o que já é um bom sinal –, é o uso de linguagem alarmista. “Última hora”, “bomba” e “alerta” são alguns dos termos usados por esses perfis.

Expressões como “plano que pode mudar o Brasil para sempre” e “assista antes que o conteúdo saia do ar” também aparecem com frequência nos posts. Então, ao se deparar com conteúdos assim, reflita se faz sentido o que é afirmado ali e busque fontes de informação fora da rede social.

O tom de teoria conspiratória surge em posts que falam de uma suposta aliança de esquerda, que envolveria nomes como Lula, Xi Jinping e Nicolás Maduro – não há nenhuma evidência de que isso ocorra.

Em alguns casos, vídeos hiper-realistas simulam apresentadores de TV em estúdios narrando supostas notícias.

Ferramenta

O coordenador científico do Centro de Excelência em Inteligência Artificial (IA) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Anderson Soares, explica que a proliferação desses vídeos ocorre porque a IA se tornou uma ferramenta e, portanto, está mais acessível aos usuários. Segundo ele, a tendência é de que esses vídeos sigam aumentando e se tornando mais realistas, à medida que os usuários aprendem conceitos de vídeos que antes não eram tão estudados.

”Isso vai ser um problema que ainda tende a aumentar bastante. E de fato aumenta os riscos na crença [nos vídeos com conteúdos falsos]. Porque cada vez mais as pessoas em tese teriam que ser criteriosas, mas na prática elas querem consumir aquilo em que acreditam, e não necessariamente aquilo que é fato ou realidade”, avalia.

Procurada pelo Comprova, a assessoria do TikTok informou que em agosto deste ano a empresa atualizou as diretrizes da comunidade para tornar a plataforma mais segura e que essas regras buscam garantir que os usuários “possam confiar que o conteúdo a que assistem é confiável, original e compartilhado por pessoas reais”.

A empresa afirmou ainda que pelo fato de o uso de IA generativa e de ferramentas de edição poderem confundir fato e ficção, a empresa exige que sejam rotulados. Caso contrário, podem ser removidos, restringidos ou receber rótulo pela equipe. A empresa também informou que tirou do ar links enviados pelo Comprova.

Fontes que consultamos: Análises dos perfis que publicam vídeos com uso de IA no TikTok e de notícias em veículos jornalísticos e de checagem sobre as informações divulgadas, ferramenta de detecção de IA Hive Moderation e entrevista com Anderson Soares, da UFG.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já publicou outros textos sobre como funciona a desinformação. Em um deles, mostrou como posts sobre o apoio do Brasil ao Irã se intensificaram com início de conflito e viralizaram na internet. Na seção Comprova Explica, publicou conteúdo sobre como as ferramentas de IA podem falhar em checagens e buscas.

Política

Investigado por: 05/09/2025

Reunião entre China, Rússia e Índia não era em cúpula do Brics e não excluiu Brasil do bloco

Política
Post que viralizou usou reunião da Organização para a Cooperação de Xangai, da qual o Brasil não faz parte, para afirmar que o país estava sendo vítima de isolamento internacional

Brasil e África do Sul não foram excluídos do Brics, grupo econômico que reúne os países emergentes, nem há indícios de que sejam alvo de uma coalizão de outros países do bloco para remodelar a aliança. As afirmações foram feitas em uma publicação na rede social X.

O post analisado pelo Comprova tira de contexto imagens de uma reunião da Organização para a Cooperação de Xangai, composta por China, Rússia, Índia e outros países, para sugerir que as nações estariam fazendo um novo arranjo político para excluir Brasil e África do Sul do Brics. A publicação não cita a fonte das informações e tenta sugerir que esse seria o motivo da ausência dos líderes do Brasil e África do Sul do encontro. O texto é acompanhado de um vídeo com um comentário da CNN Brasil que traz imagens dos líderes de China, Rússia e Índia na cúpula da Organização para a Cooperação de Xangai, entidade de países asiáticos da qual o Brasil não faz parte.

Não há registros de negociações de China, Rússia e Índia para excluir o Brasil do Brics, nem de que esse assunto tenha sido discutido na cúpula da Organização para Cooperação de Xangai. As últimas demonstrações entre os países do bloco foram de apoio no contexto de enfrentamento às sanções e sobretaxas impostas pelos Estados Unidos. A China já sinalizou que está disposta a se unir ao Brasil para fortalecer o Brics e “resistir a atos de intimidação”. A mensagem foi publicada pelo porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, na rede social X, conforme noticiou o portal g1.

Ao Comprova, o Ministério das Relações Exteriores acrescentou que o Brasil inclusive exerce a presidência rotativa do Brics ao longo de 2025, “cabendo-lhe organizar as reuniões do agrupamento”, e refor��ou que o país não é membro da Organização para a Cooperação de Xangai, que tem caráter regional. Segundo reportagem da CNN Brasil, para a recente cúpula foram convidados líderes da Ásia Central, Oriente Médio, Sul e Sudeste Asiático.

O texto também afirma que, além do Brasil, a África do Sul seria outro alvo de exclusão do Brics. O motivo seria o fato de o país estar se tornando “campo de genocídio ‘em massa’ com grupos radicais matando os grandes fazendeiros da região”. A afirmação não é verdadeira e repete teoria já afirmada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em reunião com o líder da África do Sul, Cyril Ramaphosa, em maio deste ano. Tratam-se de alegações que circulam há muitos anos entre grupos de direita e que já foram desmentidas em reportagens de veículos como BBC News e g1.

A reunião recente entre os líderes de China, Rússia e Índia chamou a atenção por unir as três potências, sobretudo os chefes de China e Índia, tradicionais rivais comerciais no Oriente. Os dois países vêm se aproximando em resposta às punições econômicas de Trump. Na cúpula sediada pelo país, a China se apresentou como alternativa de líder global, contrapondo-se à política de sanções americanas a países estrangeiros.

Organização para a Cooperação de Xangai x Brics

A Organização para a Cooperação de Xangai é formada por 10 membros-plenos: China, Rússia, Índia, Bielorrússia, Cazaquistão, Irã, Paquistão, Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão. Outros 16 países são observadores ou parceiros de diálogo.

Já o Brics foi composto inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Incorporou mais seis novos membros nos últimos anos e tem ganhado evidência à medida em que se contrapõe às políticas isolacionistas e de embate ao multilateralismo dos Estados Unidos, lideradas por Donald Trump. A última cúpula do Brics ocorreu em julho deste ano e foi sediada justamente pelo Brasil, no Rio de Janeiro. O Brasil prepara ainda uma reunião virtual com países do bloco para a segunda semana de setembro para discutir o comércio global em meio às novas tarifas norte-americanas.

A atual presidente do Banco do Brics também é brasileira. A ex-presidente da República Dilma Rousseff foi reconduzida ao cargo em março deste ano, com aval do presidente russo Vladimir Putin, como mostrou publicação da Agência Brasil.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A publicação foi feita por uma usuária no X que tinha 6,5 mil seguidores até a publicação deste texto. Ela se define no perfil como empreendedora, “apaixonada pela pátria e pelo conhecimento, sem partido de estimação e alérgica ao PT e ao comunismo”. A conta possui diversas publicações de teor político e de apoio a teses do grupo bolsonarista. A postagem analisada teve 148 mil visualizações até a publicação desta verificação. O Comprova tentou contato com a autora, mas o perfil no X não permite o envio de mensagens.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação usa como uma das táticas misturar informações verdadeiras, como o vídeo da CNN que mostra a abertura da cúpula da Organização para Cooperação de Xangai, com afirmações falsas, como a tentativa de expulsar Lula e o Brasil do Brics e o suposto “genocídio” na África do Sul.

A estratégia é comum em conteúdos de desinformação. As fontes das supostas informações também não são informadas. A postagem apela ainda à linguagem polarizadora, ao afirmar que “Lula é um grande problema para qualquer pessoa no mundo”.

No X, usuários fizeram comentários pedindo que o Grok, ferramenta de inteligência artificial da rede social, confirmasse se as informações eram reais, o que sugere que as pessoas podem ter acreditado na publicação. O Comprova já mostrou que esse tipo de recurso não deve ser usado para confirmar a veracidade de informações, pois pode falhar.

Fontes que consultamos: Pesquisas em veículos jornalísticos e institucionais sobre conteúdos da Organização para a Cooperação de Xangai e o Brics, e contato com o Ministério das Relações Exteriores.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que a China não rompeu com o Brasil em meio a disputa comercial com os EUA, que o New York Times não noticiou suposta investigação de Trump contra Eduardo Bolsonaro e que Trump não ameaçou enviar tropas contra Alexandre de Moraes.

Notas da comunidade: A publicação analisada não tinha notas da comunidade até a conclusão desta verificação.

Política

Investigado por: 05/09/2025

Vídeo inventa tentativa de compra de mansão nos EUA por Janja

Política
Uma voz gerada por inteligência artificial foi usada no vídeo que inicialmente espalhou a desinformação a respeito da primeira-dama

Ao contrário do que afirma um vídeo, não é verdade que a primeira-dama, Janja da Silva, tenha tentado comprar uma mansão na Flórida avaliada em US$ 15 milhões com recursos públicos desviados do Brasil. Também não há indícios de que a suposta operação teria sido barrada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

No TikTok, um ex-locutor esportivo reproduz as alegações de um vídeo publicado em um canal do YouTube que não apresenta nenhuma prova. A narração da gravação original é creditada a um suposto jornalista investigativo chamado André Molina, sobre o qual não há qualquer registro.

O vídeo no YouTube que deu origem ao boato começa da seguinte forma: “Meu nome é André Molina, repórter investigativo há mais de 15 anos, e hoje trago a vocês uma reportagem…”. No entanto, a voz tem características de ter sido gerada por inteligência artificial. Um trecho do áudio do vídeo foi submetido à ferramenta Hiya.com do InVID, que detecta conteúdos sintéticos.

O resultado (reprodução abaixo) aponta indícios de manipulação: “Hiya.com considera este fragmento de áudio como muito provavelmente gerado por IA”. O projeto InVID reúne ferramentas que auxiliam a checagem de fatos e foi desenvolvido por diversas organizações, como a Agência France Press (AFP), com financiamento da União Europeia.

Em vários momentos, a narração do vídeo afirma ter tido acesso a documentos confidenciais e trocas de e-mail que confirmariam a história, mas nada é apresentado. O vídeo tem um total de 23 minutos e mostra fotos de Trump e Janja que permanecem na tela do início ao fim do conteúdo.

A foto que ilustra o perfil do canal, que mostra um homem ao microfone, também tem características de ter sido gerada por IA.

Secom nega teor do conteúdo

Não há qualquer registro que corrobore a história em veículos de imprensa no Brasil ou no exterior. Também não existe qualquer menção nos perfis oficiais de Trump ou do Departamento de Estado americano nas redes – que estariam envolvidos diretamente no suposto episódio.

Procurada, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom) afirmou que o conteúdo “evidentemente é falso”. O órgão acrescentou que “repudia a divulgação de boatos falsos com objetivos políticos, que visam única e exclusivamente desinformar a população, atacar reputações, enfraquecer instituições e manipular a opinião pública”.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O homem que repercute a desinformação em suas contas no TikTok e no Instagram é o ex-locutor esportivo José Roberto Papacídero. Ele grava vídeos com críticas ao atual governo federal, ao presidente Lula, ao Judiciário brasileiro e à imprensa. Ele foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu até o fechamento deste texto.

Já o canal no YouTube que inicialmente divulgou o boato falso foi criado em abril do ano passado e divulga uma série de histórias falsas como se fossem reportagens investigativas. Nenhuma prova é apresentada – consta apenas o relato feito pela mesma voz com características de ter sido gerada por IA.

Além disso, o tom aparentemente bombástico usado nos vídeos leva a crer que as supostas notícias seriam amplamente divulgadas na imprensa, o que não acontece em nenhum dos casos. A maioria dos conteúdos são contra Lula e Janja. O Comprova não encontrou meios de contatar o canal.

Por que as pessoas podem ter acreditado

Há um esforço para fazer parecer que o conteúdo é uma reportagem investigativa. Cria-se o nome de um suposto repórter com mais de 15 anos de experiência e menciona-se acesso a documentos e e-mails secretos. Destaca-se ainda o apelo emocional usado pelo homem que repercute o conteúdo do YouTube nas redes sociais, ao dizer que a “notícia vai deixar vocês indignados, revoltados”.

Fontes que consultamos: O Comprova consultou o canal no YouTube que inicialmente divulgou a notícia falsa e os perfis nas redes sociais do homem que repercutiu o vídeo. Houve ainda buscas em perfis de Trump e do Departamento de Estado americano e consulta em veículos de imprensa. A Secom também foi procurada.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A alegação sobre a suposta tentativa de compra de uma mansão na Flórida pela primeira-dama também foi verificada pelo Aos Fatos e pelo Boatos.org. Em maio, o Comprova mostrou que Janja não foi sozinha à Rússia e não há provas de que ela seja vigiada por autoridades norte-americanas.

Contextualizando

Investigado por: 05/09/2025

Governo brasileiro não vendeu minas de níquel à China

Contextualizando
A venda é um negócio privado entre uma empresa britânica e outra chinesa, sendo que o governo do Brasil pode atuar apenas por meio de órgãos regulatórios como o Cade

Conteúdo analisado: Posts que repercutem uma operação de venda de minas de níquel no Brasil pela empresa britânica Anglo American à chinesa Minmetals, mesmo tendo recebido uma oferta maior da Corex Holding, sediada na Holanda. Os autores das publicações associaram a transação à relação comercial entre os governos do Brasil e da China, sem considerar que são empresas privadas que estão envolvidas na operação.

Onde foi publicado: X.

Contextualizando: A mineradora britânica Anglo American vendeu suas minas de níquel no Brasil para a chinesa Minmetals por US$ 500 milhões, apesar de a holandesa Corex Holding ter oferecido US$ 900 milhões pelas mesmas minas. A operação foi questionada pela Corex em órgãos brasileiros como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) usou como gancho a notícia da transação para acusar o “governo Lula” de estar “vendendo o Brasil para a China”, em uma publicação no X. Para isso, ele utilizou uma captura de tela de uma matéria do portal Poder360, publicada em 25 de agosto, que, inicialmente, trazia um título que reduzia a compra e venda a uma operação entre Brasil e China. Porém, o veículo alterou o título de sua matéria para “Anglo American vende minas de níquel no Brasil à China apesar de proposta maior” e a versão capturada por Flávio Bolsonaro não está mais no ar.

Victor Brandão, da equipe de Relações Governamentais da BMJ Consultores Associados, especializada em consultorias entre entidades públicas e privadas, explicou ao Comprova que a atuação do governo brasileiro do ponto de vista regulatório deve acontecer por meio do Cade, que já foi acionado e está investigando a transação. Pelo fato de que, com a compra, a China irá passar a produzir mais de 50% do níquel no Brasil, Brandão considera que, sim, o Cade precisará deliberar a respeito.

O Comprova também entrou em contato com a Agência Nacional de Mineração (ANM), que respondeu de forma similar ao consultor. Segundo o órgão, vinculado ao Ministério de Minas e Energia, “eventuais negociações comerciais envolvendo ativos minerários são de responsabilidade exclusiva das empresas interessadas”. Ou seja, cabe à titular dos direitos minerários decidir a quem pretende ceder seus ativos, inclusive no que se refere a valores e condições de mercado.

ANM afirmou não regular esse tipo de negociação, mas pode analisar e aprovar, posteriormente, quando cabível, se a nova empresa cessionária atende aos requisitos legais mínimos e se cumpre as normas que regem a cessão de direitos minerários no Brasil. A agência também frisou o papel do Cade na análise de fusões e aquisições econômicas.

Também procurada, a Anglo American explicou que escolheu uma oferta de menor valor pela “qualidade geral da proposta” – incluindo garantias financeiras, capacidade técnica, histórico operacional e estrutura corporativa robusta. “A MMG é uma empresa de capital aberto, com valor de mercado de aproximadamente US$ 4,7 bilhões, reconhecida internacionalmente por operar de forma segura e responsável, com condições sólidas para investir no desenvolvimento de longo prazo dos ativos adquiridos”, defendeu a britânica, que está se desfazendo de seus ativos em níquel no Brasil.

O empresário turco Robert Yildrim, dono do conglomerado que detém a Corex, deu entrevista à Folha sobre ter perdido a concorrência. Ele disse que “esperava um tratamento justo e uma explicação”.Foi a primeira vez que vi isso e já comprei empresas em 58 países. Nunca vi um vendedor recusar aumento de preço. Pediram carta bancária, entreguei. Não viram problema de financiamento. Ainda assim, ficamos de fora. Isso me feriu muito”, disse Yildrim, que também acionou a Comissão Europeia para investigar a transação.

Fontes consultadas: Victor Brandão, integrante da equipe de Relações Governamentais da BMJ, ANM, Anglo American e reportagens sobre o tema. Tentamos contato com o Cade, mas não houve retorno.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: A questão já foi verificada por outras iniciativas, como o Estadão Verifica e o portal E-Farsas.

Comprova Explica

Investigado por: 03/09/2025

Entenda como a modernização de cadastros da Reforma Tributária pode reajustar seu IPTU

Comprova Explica
Mesmo sem alterar as alíquotas, a nova forma de calcular o valor venal dos imóveis deve influenciar o total a ser pago; imposto sobre herança também muda.

Conteúdo analisado: A reforma tributária brasileira trouxe alterações significativas na forma de cobrança de impostos sobre imóveis e heranças. As principais mudanças não estão na fórmula de cálculo, mas na digitalização e integração de dados, que prometem mais clareza, mas podem gerar reajustes nos valores pagos por IPTU e ITCMD. O Comprova identificou publicações nas redes sociais que revelam dúvidas sobre as mudanças.

Comprova Explica : Você provavelmente já ouviu falar da reforma tributária, mas talvez ainda não saiba como ela impacta seu dia a dia. As mudanças no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e no ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) são um dos pontos que mais afetam os contribuintes. Para esclarecer o que está mudando e por que o valor do seu imposto pode aumentar, conversamos com o advogado tributarista Bruno Gonçalves e consultamos informações da Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo e da Receita Federal. Veja abaixo as respostas sobre as principais perguntas a respeito do tema.

O que são IPTU e ITCMD e como eles mudam com a reforma?

O IPTU é um imposto municipal cobrado sobre a propriedade de imóveis em áreas urbanas. Já o ITCMD é um imposto estadual que incide sobre heranças e doações.

A reforma não alterou a fórmula de cálculo de ambos, que continua sendo a multiplicação do valor venal (leia mais abaixo) pela alíquota do imposto. A grande mudança está na forma como o valor venal é apurado, a partir da criação de dois novos sistemas: o CIB e o SINTER.

O que são CIB e SINTER e como vão funcionar?

O CIB e o Sinter têm a promessa de modernizar o sistema tributário. A ideia é que a tecnologia ajude a dar mais transparência e agilidade na coleta de informações sobre as propriedades.

  • CIB (Cadastro Imobiliário Brasileiro): Vai funcionar como um “CPF” para cada imóvel no país, atribuindo um código de identificação único. Isso unifica as informações sobre a propriedade em um só lugar.
  • SINTER (Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais): Essa é uma plataforma da Receita Federal que vai integrar os dados do CIB com os de cartórios, prefeituras e outros órgãos. Isso permitirá um monitoramento, quase em tempo real, das transações imobiliárias.

A implementação já está em andamento. A previsão é que os novos sistemas comecem a funcionar a partir de 1º de janeiro de 2026 para as capitais e a partir de 1º de janeiro de 2027 para os demais municípios.

O que é valor venal e por que o imposto pode aumentar?

O valor venal de um imóvel é o preço estimado pelo poder público para uma transação à vista. Antes da reforma tributária, esse valor podia variar dependendo do órgão responsável. As prefeituras, por exemplo, o utilizavam para calcular o IPTU, enquanto os estados o usavam para o ITCMD.

Com a Reforma Tributária e a implementação de sistemas como o CIB e o SINTER, a tendência é que o valor venal se aproxime cada vez mais do valor de mercado efetivo, ou seja, o preço real pelo qual o imóvel é vendido.

Com o novo sistema, haverá um único valor venal para cada imóvel. Isso traz mais segurança jurídica, mas também significa que a atualização será mais frequente. Como as prefeituras não costumavam atualizar o valor venal regularmente, o IPTU era cobrado sobre uma base de cálculo defasada.

Com a fiscalização automática do SINTER, o valor venal passará a refletir o preço de mercado. O resultado é que, embora a alíquota não mude, a base de cálculo poderá ser maior e, nesse caso, levar a um aumento no valor final do IPTU a ser pago.

E o que muda no ITCMD?

No caso do ITCMD, a principal mudança é a progressividade da alíquota. Isso significa que quem receber heranças ou doações de menor valor pagará uma alíquota menor, enquanto quem receber bens de maior valor pagará uma alíquota mais alta.

Essa mudança pode, de fato, gerar um aumento na carga tributária para aqueles que recebem grandes quantias. Por isso, especialista alerta que é importante ficar atento ao planejamento tributário para evitar surpresas no futuro.

Fontes consultadas: O Comprova consultou o advogado tributarista Bruno Tadeu Radtke Gonçalves, a Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo e a Receita Federal.

Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O Comprova fez uma matéria falando sobre a proposta de tributação de dividendos feita pelo governo federal e sobre Reforma tributária não prevê taxa de 25% em compra e venda de imóveis, diferentemente do que afirma post.

Política

Investigado por: 02/09/2025

Capa da Veja sobre julgamento no STF foi manipulada em postagem de Flávio Bolsonaro

Política
Sem informar sobre edição, senador divulgou imagem na qual a palavra “julgamento” aparece riscada e substituída pelo termo "farsa"

É manipulada a capa da edição desta semana da revista Veja que classifica de “farsa” o julgamento da tentativa de golpe de Estado que começa nesta terça-feira, 2, no Supremo Tribunal Federal (STF), e tem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como um dos réus.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente, postou uma imagem adulterada da capa da revista, na qual a palavra “julgamento” aparece riscada. Sobre ela, há, em vermelho, a expressão “a farsa”.

A edição da Veja foi publicada na última sexta-feira, 29, e traz a imagem de Bolsonaro diante dos ministros da Primeira Turma do STF. Na capa original, disponível no site da revista, é possível ver a imagem sem alterações.

| Comparação entre a imagem manipulada (à esquerda) postada e a capa da revista Veja (à direita)

Na rede social X, Flávio Bolsonaro compartilhou a capa adulterada sob a legenda: “Numa banca perto da sua casa”. Já no Instagram, o senador escreveu a legenda: “A História mostrará quem acabou com a democracia no Brasil. Deixe aqui seu comentário”.

Tanto no X quanto no Instagram, Flávio Bolsonaro não deixa claro que a imagem é uma montagem. Nas interações, é possível perceber que algumas pessoas acreditaram que a capa manipulada era real. “Finalmente alguém da velha mídia falando o óbvio”, escreve um internauta. Outro diz: “Rapaz, se nem a revista Veja acredita neste julgamento, quem vai acreditar?” Há ainda pessoas em dúvida, que marcaram a ferramenta de inteligência artificial do X (Grok) para checar a veracidade da imagem.

No X, é possível ver uma captura de tela com algumas das interações na postagem. No Instagram, o comportamento dos internautas foi semelhante. “Até a veja kkkkk vixi tá feio STF casa caiu ditadores corruptos”, “ninguém acredita nessa ‘imprensa’ vendida” e “Essa capa da veja é original mesmo?” foram alguns dos comentários.

Somadas, as postagens no X e no Instagram contabilizam mais de 119 mil curtidas, cerca de 9 mil comentários e ao menos 7 mil compartilhamentos.

Na avaliação de Flávio Bolsonaro, o julgamento de seu pai por tentativa de golpe de Estado configura “perseguição” e “covardia”. Com a manipulação da capa da Veja, procura passar a ideia de que o julgamento é injustificado e de que não há isenção por parte dos ministros do STF.

A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 tem base em investigação da Polícia Federal (PF). Ela foi dividida em cinco núcleos de atuação. Jair Bolsonaro integra o principal grupo dos réus, o “núcleo 1″, também chamado de “núcleo crucial”, composto por pessoas que estariam em posição de comando. O “núcleo 1” será julgado a partir desta terça-feira, 2, pela Primeira Turma do STF.

A assessoria de imprensa de Flávio Bolsonaro foi procurada, mas não respondeu até o fechamento desta matéria.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A postagem mais antiga com a capa adulterada foi postada por Flávio Bolsonaro. A mesma imagem foi usada por outro usuário no X, também sem identificação de que se tratava de uma montagem. O Comprova encontrou, também no X, outra versão editada da mesma capa da revista Veja, que também atacava o julgamento e que também não trazia identificação de manipulação por parte do responsável.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A legenda “Numa banca perto da sua casa” associada à capa da Veja adulterada, sem qualquer indicação de que a imagem foi manipulada, pode levar internautas a acreditar que a imagem é verdadeira, o que, de fato, aconteceu, como se percebe nos comentários destacados neste texto. Outros demonstraram dúvida, e chegaram a perguntar à IA do X se a capa era verdadeira.

Fontes que consultamos: O site oficial da revista Veja, postagens nas redes sociais e a assessoria de imprensa de Flávio Bolsonaro.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova mostrou recentemente que homem com hanseníase foi condenado por associação criminosa no 8 de janeiro e não por “vender balas” e que vídeo com idoso com tornozeleira não tem relação confirmada com os atos de depredação em Brasília.

Notas da comunidade: Não havia “notas da comunidade” na postagem no X até o fechamento deste texto.

Golpes virtuais

Investigado por: 29/08/2025

Saiba como se precaver de golpes por telefone que utilizam técnica conhecida como ‘spoofing’

Golpes virtuais
Criminosos que aplicam golpes por meio de ligações telefônicas utilizam técnica conhecida como spoofing para alterar o número que realiza a chamada. O objetivo é ocultar a origem da ligação e fazer com que apareça no visor um número que seja semelhante ao de algum órgão ou instituição bancária, aumentando as probabilidades de que a vítima em potencial atenda o telefonema.

Tática de spoofing para aplicar golpes de engenharia social

Como os golpistas abordam as pessoas: Criminosos ocultam a identificação real da origem das ligações telefônicas para a prática de golpes a partir de uma técnica conhecida como spoofing. O termo vem do verbo spoof, que significa “enganar” em inglês. Na prática, o número de telefone que aparece no visor do celular de quem recebe a ligação é diferente do número que, de fato, está realizando a chamada.

Segundo o professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal Fluminense (UFF), Igor Monteiro Moraes, o spoofing é feito a partir de softwares específicos e utilizado pelos golpistas com dois objetivos: dificultar a identificação de quem está praticando o golpe e simular um número que aumente a probabilidade de o recebedor atender a ligação.

Neste último caso, Moraes cita alguns exemplos, como a utilização de um DDD que seja da mesma cidade do recebedor da chamada ou números semelhantes aos de bancos.

“Por exemplo, o Banco do Brasil é famoso por usar o prefixo de telefone 4004. Então, os golpistas podem usar um número que comece com 4004, 94004 ou 44004, que remeta ao Banco do Brasil e, por ser parecido, induza a vítima a atender achando que é alguém do banco que está ligando, mas, na realidade, o contato está sendo feito por um golpista”, explica o professor.

Moraes acrescenta que os criminosos podem ainda utilizar um número semelhante ao do recebedor da ligação para parecer que a chamada é de um telefone próximo ou, a partir de uma informação privilegiada, como a agenda do telefone de uma possível vítima, o número de uma pessoa próxima, alternando apenas um algarismo. “Neste caso seria uma tentativa de ataque mais sofisticada”, diz o professor.

Que táticas eles usam para chamar a atenção: Após o atendimento da ligação, os criminosos usam as chamadas técnicas de engenharia social para aplicar os golpes. Segundo uma publicação no site do Ministério da Fazenda, elas consistem em manipulação psicológica “para induzir as pessoas ao erro e enganá-las através de narrativas convincentes”. Idosos, pessoas com dificuldades tecnológicas ou problemas financeiros são os alvos preferidos dos golpistas.

“Eles já abordam a pessoa com o problema para que ela tome uma solução”, explica a advogada criminalista Ana Beatriz Krasovic. “A gente chama isso de urgência forçada. Eles não conversam, não explicam toda a situação, o porquê da ligação, justamente para que a pessoa não tenha tempo de pensar. A pessoa automaticamente, inconscientemente, quer resolver aquele problema e acaba caindo no golpe.”

Segundo a advogada, outra característica das ligações é o fato de elas serem curtas e ágeis, para que as pessoas não percebam que se trata de um golpe. Outro ponto são saudações genéricas, em alguns casos sem citar o nome da pessoa que atende a ligação. No entanto, a advogada chama a atenção para o caso em que há vazamento de dados. “Às vezes a pessoa tem um nome composto, mas o golpista cita apenas o primeiro nome, que foi a informação à qual ele teve acesso”, acrescenta Ana Beatriz.

A advogada cita outros exemplos que envolvem vazamentos de dados, como acesso a telefones de pessoas que contraíram empréstimos. Neste caso, golpistas fazem contato e oferecem falsos descontos na quitação de parcelas em aberto. Em outra situação, criminosos obtêm informações de pessoas que simularam a contratação de um cartão de crédito com um limite superior. “Então, o golpista entra em contato e diz que o cartão está disponível mediante algumas condições”, diz a advogada.

Qual é o objetivo do golpe: Fraudes financeiras e obtenção de dados pessoais.

Como se proteger: Especialista em privacidade e proteção de dados, a advogada Antonielle Freitas orienta a nunca fornecer códigos, senhas ou autorizar transações por telefone quando a chamada for inesperada. “O mais seguro é desconfiar de qualquer pedido de informação pessoal feito em ligação não solicitada”, diz.

A advogada também orienta que se evite divulgar o número de telefone publicamente em redes sociais e formulários abertos. Já em casos de solicitações urgentes e ameaças, a orientação é desligar e confirmar a situação diretamente com a instituição pela qual os golpistas tentam se passar.

“Sempre é recomendável que a pessoa vá até a agência bancária para realizar algum serviço”, acrescenta Ana Beatriz. “Em casos de bancos digitais, a dica é utilizar o próprio aplicativo da instituição”.

De acordo com Antonella, outras orientações são:

  • Ativar o bloqueio do celular (senha ou biometria) e manter o sistema e os aplicativos atualizados.
  • Instalar e ativar um identificador de chamadas confiável por meio de recursos do próprio celular ou apps conhecidos.
  • Utilizar serviços oferecidos pela sua operadora que filtram ou alertam sobre chamadas suspeitas.

A quem denunciar: No caso de cair no golpe, as advogadas orientam a guardar prints, gravações, registros de chamadas e extratos bancários, além de registrar ocorrência em delegacia e comunicar ao banco imediatamente.

Também consultada, a pesquisadora do programa de Telecomunicações e Direitos Digitais do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) Marina Fernandes acrescenta que, caso a pessoa identifique que seus dados estão sendo tratados de forma ilícita, é possível enviar uma petição para a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

O que diz a Anatel: Procurada, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que todas as ligações que utilizam o mecanismo de spoofing “são consideradas fraudulentas e irregulares em todos os casos”. De acordo com a agência, o Despacho Decisório nº 262/2024/COGE/SCO, de 23 de setembro, estabeleceu uma série de medidas para que as prestadoras de telefonia fixa e móvel possam prevenir e combater a prática. Dentre elas, estão a suspensão da comercialização de produtos ou serviços que permitam a alteração indevida do número de origem, a proibição da revenda de recursos de numeração, o monitoramento e bloqueio de tráfego irregular entre operadoras e a criação de um canal setorial com instituições financeiras para o reporte de números suspeitos.

Já a Resolução nº 777, de 28 de maio, tornou obrigatória a autenticação de todas as chamadas telefônicas. O processo técnico é realizado pelas operadoras e consiste em verificar a legitimidade do número de origem da chamada, garantindo que ele não foi falsificado. Segundo a Anatel, as prestadoras têm um prazo de 3 anos para implementar a autenticação em todas as suas chamadas.

Outra medida, informou a Anatel, é o Acórdão 201/2025, de 14 de agosto de 2025, que estabeleceu um prazo de 90 dias para que todos os assinantes que originarem mais de 500 mil chamadas por mês passem obrigatoriamente a utilizar a funcionalidade de autenticação. A medida ainda prevê que chamadas com adulteração de identificador deverão ser bloqueadas de forma automatizada.

Desconfiou que é golpe? O Comprova pode ajudar a verificar: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, eleições e possíveis golpes digitais e abre verificações para os conteúdos duvidosos que mais viralizam. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: Recentemente, o Comprova mostrou como identificar e se proteger de golpes de chamadas de robôs.

Política

Investigado por: 28/08/2025

New York Times não noticiou suposta investigação de Trump contra Eduardo Bolsonaro

Política
Vídeos com uso de Inteligência Artificial sugerem pedido de apuração do presidente norte-americano contra deputado brasileiro, mas não há registros de investigação

O jornal norte-americano The New York Times não noticiou nenhum pedido de investigação do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o deputado federal brasileiro Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o aliado bolsonarista Paulo Figueiredo. Vídeos que circulam nas redes sociais afirmam que o veículo publicou reportagem informando sobre um pedido de Trump ao secretário Marco Rubio para apurar as informações repassadas por Eduardo Bolsonaro sobre o Brasil por suspeita de que elas “estariam sendo transmitidas de forma distorcida”. O jornal, no entanto, não publicou nenhuma reportagem sobre o tema.

Em busca no site do NYT, o resultado mais recente envolvendo Eduardo Bolsonaro é uma matéria de 20 de agosto. Ela abordava o plano de Bolsonaro de pedir asilo à Argentina, revelado pela Polícia Federal naquela semana, quando o ex-presidente e o filho foram indiciados em investigação por suposta coação no curso do processo.

Antes disso, o resultado disponível é de 5 de agosto, de reportagem sobre a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro e também cita que Eduardo “passou meses fazendo lobby na Casa Branca para ajudar o pai”. A última matéria que aparece na busca do NYT e fala especificamente sobre Eduardo Bolsonaro é de 18 de março. A notícia afirma que o deputado brasileiro iria pedir asilo político aos Estados Unidos e denunciar suposta perseguição ao pai no Brasil. Pesquisas por reportagens sobre a investigação de Trump contra o parlamentar em outros portais do Brasil e dos Estados Unidos também não retornaram resultados.

As publicações começaram a circular dias depois da divulgação do relatório da Polícia Federal que indiciou Jair e Eduardo Bolsonaro. No documento, agentes da PF afirmam que o filho do ex-presidente teria atuado para tentar “ludibriar” o governo Trump “para atingir seus objetivos criminosos”. Em uma das mensagens divulgadas, Eduardo enviou ao celular do pai uma imagem que não pôde ser recuperada pelos investigadores, seguida da frase: “torce para a inteligência americana não levar isso aqui ao conhecimento do Trump”.

Os vídeos que sugerem a investigação de Trump contra Eduardo Bolsonaro afirmam ainda que a apuração poderia resultar em pedidos de revogação do visto do deputado brasileiro e a deportação de Eduardo e Paulo Figueiredo para o Brasil. Também não há atualmente qualquer indício de que essas medidas estejam em curso.. Eduardo Bolsonaro foi indicado no inquérito que apura suposta coação no curso do processo envolvendo o pai, mas não é alvo de pedido de prisão ou deportação.

Os vídeos verificados pelo Comprova utilizam narração e elementos de inteligência artificial. De acordo com o Hive Moderation, ferramenta de reconhecimento de IA, possuem 99,9% de chance de terem sido gerados por IA. Vale lembrar que ferramentas de IA podem falhar na detecção de conteúdos, por isso devem ser usadas como apoio à análise humana.

Um dos vídeos, divulgado no TikTok, traz ainda como elementos de uso de IA imagens de Trump com semblante furioso e um carimbo na mão em frente a um homem com feições semelhantes a Eduardo Bolsonaro e aspecto assustado, de posse de um passaporte. A imagem é exibida em uma montagem em uma suposta capa do The New York Times.

O Comprova fez contato com os perfis que divulgaram os dois vídeos investigados por meio de mensagens no TikTok, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

Um dos vídeos investigados foi divulgado por um perfil no YouTube que se apresenta na descrição apenas como canal com “vídeos diários”. As publicações, no entanto, costumam trazer vídeos feitos com fotos de políticos e narração com auxílio de inteligência artificial.

As postagens reúnem tanto vídeos com tons favoráveis ao presidente Lula e ao PT, como o vídeo que sugere investigação e até suposta deportação de Eduardo Bolsonaro, quanto publicações em linha com o bolsonarismo, com críticas de Trump a decisões do ministro Alexandre de Moraes.

O canal tinha 16 mil inscritos até a publicação desta matéria. Já o outro vídeo investigado tem informações semelhantes e foi divulgado na plataforma TikTok. A conta que o divulgou se apresenta como “Canal de apoio ao Lula em 2026”. A página tinha 71 mil seguidores até a publicação deste conteúdo.

Por que as pessoas podem ter acreditado

Uma das táticas de persuasão utilizadas no vídeo e que podem fazer com que as pessoas possam ter acreditado é citar como suposta fonte das informações o jornal The New York Times, um dos maiores do mundo e referência em informações sobre política norte-americana. Isso poderia conferir suposta credibilidade às informações.

Um dos vídeos também faz referência a termos como “explosão na América”, “investigação bombástica” e que “a verdade tem que explodir agora”, apelando ao exagero e a um suposto senso de urgência para que os usuários compartilhem o vídeo sem confirmar as informações.

Fontes que consultamos: Site do The New York Times, ferramenta Hive Moderation, de detecção de IA, e donos dos perfis que publicaram os vídeos investigados.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Os vídeos que sugerem investigação de Trump contra Eduardo Bolsonaro também foram alvo de verificações que desmentiram o fato feitas pelo Estadão Verifica, pela agência Aos Fatos e pelo UOL Confere. O Comprova também já mostrou que Trump não ameaçou enviar tropas contra Alexandre de Moraes e que não há indícios de que o presidente norte-americano tenha tarifado o Brasil por compra de diesel russo.

Política

Investigado por: 28/08/2025

Homem com hanseníase foi condenado por associação criminosa no 8/1 e não por “vender balas”

Política
Publicações nas redes sociais sugerem que acusado teria sido preso por comercializar doces em acampamento em frente ao quartel do Exército, mas julgamento no Supremo considerou que réu participou dos atos.

Um homem preso em Brasília após os ataques de 8 de janeiro, e que afirmou em depoimento ter ido ao local apenas para “vender balas”, foi condenado por associação criminosa e incitação ao crime. Publicações que circulam nas redes sociais desinformam ao dizer que ele foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) “por vender balas”.

As postagens foram compartilhadas nos últimos dias por usuários das redes sociais TikTok e X, incluindo o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). As mensagens afirmam ainda que o acusado tem “lepra”, termo antigo e depreciativo para se referir à doença hanseníase.

O caso em questão envolve Davi Alves Torres, de 47 anos, morador de Brasília. Ele foi detido no acampamento montado em frente ao quartel-general do Exército, na capital federal, após os atentados realizados contra os prédios públicos em 8 de janeiro.

Foi o voto do ministro Alexandre de Moraes que embasou a condenação. De acordo com o ministro, no celular de Davi foram encontradas imagens que mostrariam a união dele com outros participantes dos atos golpistas e um vídeo do edifício-sede do STF sendo destruído no dia 8 de janeiro de 2023.

A condenação foi confirmada em 5 de agosto, em julgamento virtual do plenário do STF, por 8 votos a 2, com posições contrárias apenas dos ministros Nunes Marques e André Mendonça.

Davi Torres foi condenado a um ano de reclusão, mas a pena foi substituída por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas por 225 horas, além de outras medidas, como multa, participação em curso sobre democracia, proibição de se ausentar da comarca em que reside e de usar redes sociais.

Em exame no Instituto Médico Legal (IML), em 15 de julho, Torres declarou ter hanseníase. Ao longo do processo, também anexou documentos de unidades de saúde do Distrito Federal que comprovam a condição e afirmou que esse diagnóstico é o motivo da sua aposentadoria por invalidez.

Ele foi solto em março de 2023 mediante o uso de tornozeleira eletrônica. Em outubro de 2024, após ser questionada sobre violações da área de circulação informadas pela Justiça, a defesa de Torres pediu a retirada da exigência de tornozeleira eletrônica. A alegação foi que, em razão do quadro de hanseníase, o equipamento “lhe causa inchaço e retenção de líquido”, o que poderia “causar inflamação em decorrência da doença” e “evoluir para novas amputações de membros”. Moraes, então, solicitou que fossem apresentados documentos médicos que comprovassem a condição.

Nos meses seguintes, a Justiça informou novos descumprimentos da área de circulação. Em decisão, Moraes afirmou que, a defesa não apresentou as explicações e novos descumprimentos foram informados. Segundo o STF, foram 17 ocorrências de violação das medidas cautelares de circulação. Em razão disso, em 8 de julho deste ano, Davi teve a prisão preventiva decretada.

De acordo com a Polícia Civil do DF, depois de passar por audiência de custódia na Divisão de Controle e Custódia de Presos (DCCP), Torres foi encaminhado para o Centro de Detenção Provisória. Ao Comprova, o advogado que representou o réu no caso, Klebes Resende da Cunha, confirmou que ele permanece preso preventivamente. O defensor afirmou que os descumprimentos ocorreram para que Torres fizesse acompanhamento médico em cidades-satélites do Distrito Federal e que isso foi informado à Justiça e reforçado na audiência de custódia. Sobre este assunto, na audiência de custódia, o juiz auxiliar do ministro Alexandre de Moraes, Rafael Henrique Janela Tamai Rocha, disse que essas justificativas deveriam ser apresentadas nos autos pela defesa sempre que houver algum tipo de descumprimento.

Apesar disso, Davi permanece preso. Segundo o advogado, o réu afirma ter ido ao acampamento apenas para vender balas para complementar a renda e não teria participado dos atos nos prédios públicos.

| Trecho do voto do Ministro Alexandre de Moraes, relator da Ação Penal 1.254 (AP 1254/DF), no Supremo Tribunal Federal, com imagens extraídas de vídeo encontrado no celular do réu sobre os atos de 8/1/2023. Link.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A postagem foi criada originalmente pelo criador de conteúdo Danuzio Neto, que divulgou a informação no Instagram em formato de card, com aparência semelhante à de uma notícia jornalística. O conteúdo, por sua vez, reproduz a narrativa publicada pela Revista Oeste, de onde saiu o texto utilizado na legenda. Posteriormente, a imagem foi amplificada pelo vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (PL), que compartilhou o material em suas redes, acrescentando a frase “democraticamente!”.

O interesse na disseminação do conteúdo parece ser político e ideológico, pois busca reforçar críticas ao STF e ao julgamento dos réus do 8 de janeiro, apresentando a condenação de forma distorcida para descredibilizar a Corte. A publicação conta com 110 mil visualizações, 13 mil curtidas e 4 mil republicações até o momento desta publicação.

A alegação central do post investigado é que o STF teria condenado um homem “por vender balas” durante os atos de 8 de janeiro. A formulação sugere que a atividade de ambulante (venda de doces) teria sido tratada como crime e motivo da condenação. No entanto, a pena de 1 ano de reclusão com outras medidas foi aplicada pelas acusações de associação criminosa e incitação ao crime.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação utiliza apelo emocional e tenta criar uma sensação de injustiça, sugerindo que o homem preso e condenado no 8 de janeiro estaria apenas “vendendo doces”.

A estratégia, capaz de gerar indignação e empatia, é usada também em outros casos, como o do idoso que utiliza tornozeleira eletrônica e confunde o equipamento com um relógio, mas que o Comprova já mostrou não ter relação confirmada com os atos de 8 de janeiro. Também pode ser identificada nos episódios do pipoqueiro e do sorveteiro citados em um discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas que não estavam trabalhando quando foram presos no acampamento em frente ao quartel do Exército, como também mostrou o Comprova.

O conteúdo também pode favorecer discursos políticos, como as críticas às decisões do STF e a defesa de anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro. A simplificação de temas jurídicos complexos, que exigem a leitura das decisões judiciais, também pode ser uma tática que ajude o conteúdo a se disseminar nas redes sociais.

Fontes que consultamos: Ação penal contra Davi Alves Torres na página do STF, buscas reversas no Google, contato com as assessorias do STF, da Polícia Civil e da Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape) e com o advogado de Davi Alves Torres.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que o vídeo de um idoso com tornozeleira eletrônica não tem relação confirmada com os atos de 8 de janeiro, que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não ameaçou enviar tropas contra Alexandre de Moraes e que uma postagem que circula nas redes tira de contexto falas de ministros do STF para forjar um embate entre eles.

Notas da comunidade: A publicação no X não tinha Notas da comunidade até a publicação desta verificação.

Contextualizando

Investigado por: 27/08/2025

Posts com frase de Lula sobre homem negro sem dentes mostram fala incompleta

Contextualizando
Presidente criticava imagem escolhida para estampar material do governo por achar que ela poderia ser preconceituosa; para especialista, fala expõe falta de preparo para tratar do tema.

Conteúdo analisado: Posts que repercutem uma frase dita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em evento em 21 de agosto. Em um deles, publicado no X, um usuário pergunta ao Grok, inteligência artificial da rede social, se é verdade que Lula disse “Isso é fotografia para você colocar representando o Brasil no exterior? Um cara sem dente e ainda é negro?”. Outro post, no Instagram, traz o mesmo trecho, também omitindo a conclusão da fala de Lula.

Onde foi publicado: X.

Contextualizando: A frase que consta nos posts é verdadeira, mas está fora de contexto pois não foi apresentada na íntegra. Durante cerimônia de entrega de 400 Unidades Odontológicas Móveis em Sorocaba (SP), o presidente contou sobre um episódio em que teria chamado a atenção do ministro Paulo Teixeira, a respeito de uma foto usada em um material para um congresso internacional. Segundo Lula, a imagem mostraria uma mulher branca sorridente e um homem negro sem dentes.

Neste momento, o presidente disse ter questionado o motivo da escolha, que, para ele, seria preconceituosa. A frase completa foi: “Isso é fotografia para você colocar representando o Brasil no exterior? Um cara sem dente e ainda é negro? Você não acha que isso é preconceito?”.

As publicações omitem a parte final da fala, em que Lula pergunta se não seria preconceito expor o homem retratado. Assim, geraram críticas ao darem a entender que ele criticava a presença de um homem negro no material. Sem a frase final de Lula, quem teve acesso aos posts pode não ter entendido que seu comentário era uma tentativa de crítica a estereótipos negativos.

Para Jamile Barreto, jornalista e especialista em Direitos Humanos, Diversidade e Violência, a fala do presidente expõe falta de preparo para tratar do tema.

“Ele errou tentando acertar. Faltou letramento racial na fala. Ao enaltecer a pessoa branca e enfatizar negativamente o homem negro, ele falhou”, avalia. “Como figura pública, não pode ser dúbio: precisa ser direto, objetivo e com consciência racial. Ele tentou, mas errou feio, e se continuar com esse tipo de fala, legitima que outros também falem assim.”

Ao site do Poder360, Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial, negou que Lula tenha sido racista. Segundo ela, “Lula se referiu a um ‘episódio’ como uma ‘importante crítica ao estigma que pesa nos ombros das pessoas negras’”.

Procurada pelo Comprova, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) afirmou que “a declaração foi tirada de contexto” e que “Lula faz uma crítica à opção editorial que reforçava uma visão preconceituosa e estigmatizada sobre as pessoas negras e a pobreza”.

Quem criou o conteúdo contextualizado pelo Comprova

Um dos posts que teve grande viralização foi publicado por um perfil no X cuja autora se descreve como “comentarista política cobrindo a guerra em Israel e geopolítica mundial”. Ela, que tem 177,6 mil seguidores, informa sua chave Pix para receber colaborações.

Ao usar a técnica de perguntar algo ao Grok, o perfil tenta se isentar da responsabilidade pela informação — no caso, desinformação — e chamar a atenção dos internautas. Mas, como já mostrado pelo Comprova, a técnica, cada vez mais usada pelos desinformadores, pode trazer respostas imprecisas, provocar danos e até colocar em risco a saúde de pessoas que seguem orientações sem validá-las com fontes confiáveis.

O perfil segue mais de 4,3 mil contas, incluindo figuras públicas. A publicação verificada aqui, de 23 de agosto, alcançou 1,6 milhão de visualizações até a publicação deste texto.

Não foi possível estabelecer contato com a proprietária do perfil para obter mais informações sobre a fonte ou a intenção da postagem.

Fontes consultadas: Entrevista com a jornalista e especialista em Direitos Humanos, Diversidade e Violência Jamile Barreto e reportagens sobre o evento do qual Lula participou. O Comprova consultou também o vídeo com a íntegra da declaração de Lula e uma fala de Anielle Franco, ministra da igualdade racial, ao Poder 360.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O Estadão Verifica analisou o mesmo conteúdo. O Comprova já publicou textos mostrando que a técnica de perguntar se algo é verdadeiro ao Grok pode trazer desinformação, como o post que mencionava processos envolvendo parentes de Hugo Motta.